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A experiência da plataforma de participação digital do governo federal foi foco do artigo Superando a exclusão digital: lições do processo de planejamento participativo nacional do Brasil (Bridging the Digital Divide: Lessons from Brazil’s national participatory planning process), publicada no site da People Powered, um centro global de democracia participativa.
O artigo analisa a plataforma brasileira e seu impacto na formulação de políticas públicas, evidenciando os desafios e avanços do país na construção de uma democracia mais acessível e inclusiva. Entre os pontos abordados, está a combinação das estratégias digitais de participação cidadã com a busca de iniciativas presenciais para aprimorar o engajamento da população com as políticas públicas, para reduzir as desigualdades no acesso às tecnologias e para fortalecer a transparência governamental.
Além disso, a reportagem explora algumas recomendações da pesquisadora Luiza Jardim para que os processos participativos no país consigam ampliar sua representatividade social e garantir maior impacto das contribuições da população na formulação de políticas públicas.
A íntegra da matéria, traduzida para o português, pode ser conferida abaixo.
Clique aqui para acessar a reportagem original, em inglês.
Tradução:
Superando a exclusão digital: lições do processo de planejamento participativo do Brasil
Para muitos, a democracia parece um navio preso em águas turbulentas, seus passageiros ansiando por um porto seguro onde suas vozes importam, mas inseguros se tal destino existe. Muitos governos e sociedades civis lutam para navegar na tempestade do desengajamento público e da desconfiança institucional, em busca de alternativas viáveis para aprofundar a participação pública.
Em meio a esses desafios, o Brasil mostra uma visão de como poderia ser a institucionalização da democracia participativa em nível nacional. A experiência recente do Brasil fornece um estudo de caso convincente, talvez até mesmo um farol — demonstrando tanto o potencial quanto as complexidades de escalar a participação digital para envolver milhões na formulação de políticas.
A participação digital está transformando a maneira como os governos se engajam com os cidadãos. No Brasil, a Plataforma Brasil Participativo foi uma iniciativa inovadora que permitiu que mais de 1,5 milhão de pessoas ajudassem a moldar seu plano plurianual. No entanto, como acontece com muitos esforços de democracia digital, questões de representação, acessibilidade e impacto surgiram.
Luiza Jardim, nossa coordenadora de programa, conduziu um estudo como parte do programa de pesquisa Cátedras Brasil para explorar os pontos fortes e lacunas desse processo participativo e propôs recomendações importantes para aprimorar futuros esforços de participação digital.
Processo de participação digital do Brasil
Como símbolo dos esforços do Brasil para reconstruir a democracia participativa após um retrocesso democrático, o Governo Federal lançou em 2023 um processo de planejamento nacional participativo — a elaboração do plano plurianual do país que orienta suas prioridades para os 4 anos seguintes. Falamos brevemente sobre isso neste post do blog na época.
Originalmente decorrente dos planos de ação da OGP, o processo teve números extraordinários: mais de 4 milhões de pessoas acessaram a plataforma, e quase 1,5 milhão de pessoas participaram — culminando no maior processo participativo digital do país e provavelmente do mundo. Mas, apesar dos números impressionantes, os participantes eram representativos da população?
Principais insights da pesquisa
O estudo descobriu:
- Alto engajamento, mas desigualdades persistentes – As mulheres foram mais ativas na votação, mas os homens propuseram mais ideias de políticas. A idade também influenciou a participação, com usuários mais jovens se engajando mais na votação, enquanto os participantes mais velhos moldaram as propostas.
- Barreiras à acessibilidade – A exclusão digital limitou o alcance da iniciativa, especialmente para grupos de baixa renda.
- Falta de deliberação – A plataforma permitiu a votação, mas restringiu a discussão, limitando o desenvolvimento colaborativo de ideias.
9 recomendações para participação digital inclusiva
Para construir uma participação digital mais forte, a pesquisa de Jardim sugere:
- Melhor coleta de dados: os governos devem monitorar a demografia dos participantes para garantir a representação.
- Participação combinada on-line e off-line: eventos como assembleias públicas devem incluir pontos de acesso digital no local para reduzir a exclusão digital.
- Integração de dispositivos móveis e mensagens: permitir a participação via WhatsApp ou Telegram pode aumentar o engajamento, conhecendo as pessoas onde elas já estão.
- IA para melhorar propostas: ferramentas baseadas em IA podem detectar propostas duplicadas e incentivar a colaboração entre proponentes, reduzindo o número de propostas semelhantes que provavelmente não serão consideradas.
- Recursos interativos: as plataformas devem permitir comentários e discussões, não apenas votos, para aumentar a deliberação e a comunicação entre os participantes.
- Workshops descentralizados: workshops presenciais da comunidade local para discutir o processo participativo e desenvolver propostas podem trazer vozes excluídas para o espaço digital.
- Hubs de WiFi para participação: bibliotecas, centros comunitários e escolas podem servir como hubs de conectividade, nos quais haveria WiFi e também folhetos ensinando as pessoas a acessar a plataforma e participar.
- Estratégias de comunicação inclusivas: os governos devem envolver as comunidades-alvo na elaboração de estratégias de divulgação para garantir que elas sejam representadas, apesar das barreiras da exclusão digital.
- Maior coordenação governamental: os ministérios devem integrar melhor a contribuição pública na tomada de decisões.
O estudo completo está disponível em português e pode ser acessado aqui .
O modelo de participação digital do Brasil pode funcionar globalmente?
A experiência do Brasil com a Plataforma Brasil Participativo oferece insights valiosos, mas até que ponto essas descobertas se aplicam a outros países?
Sim: Lições globais do caso do Brasil
Muitos dos desafios e recomendações da pesquisa são amplamente relevantes , especialmente para governos e organizações que buscam fortalecer a participação digital. Principais conclusões que se aplicam globalmente incluem:
- Reduzindo a exclusão digital – Muitos países enfrentam disparidades no acesso à internet e na alfabetização digital, tornando os modelos de participação híbridos essenciais.
- IA e automação para acessibilidade – Usar IA para detectar propostas duplicadas e melhorar o compartilhamento de ideias pode agilizar a participação em diferentes regiões.
- Combinando engajamento online e offline – Governos em todo o mundo podem integrar reuniões presenciais com ferramentas de participação digital para aumentar a inclusão.
Depende: Locais e contextos importam
Apesar dessas lições globais, o modelo brasileiro pode não se adequar a todos os países sem ajustes:
- Lacunas de infraestrutura e conectividade: Em algumas regiões de baixa conectividade, a participação online é limitada, exigindo alternativas offline, como informações por SMS ou consultas lideradas pela comunidade.
- Vontade política e adesão institucional: a abordagem participativa do Brasil se beneficiou do apoio do governo . Em ambientes políticos mais restritivos, a participação digital pode enfrentar censura ou falta de transparência.
- Engajamento e confiança cívica: alguns países têm baixa confiança nas plataformas digitais administradas pelo governo, o que significa que a sociedade civil ou plataformas independentes podem desempenhar um papel maior.
Por que isso é importante?
A participação digital é uma ferramenta poderosa, mas somente se for inclusiva . A experiência do Brasil oferece lições valiosas sobre o fortalecimento da participação além da tecnologia — por meio de deliberação, acessibilidade e capacidade de resposta do governo.
Ao implementar essas estratégias, a democracia digital pode se tornar mais representativa, eficaz e fortalecedora.